Muitos críticos das Escrituras afirmam que o Novo Testamento foi forjado pela Igreja para dar sustento aos seus caprichos. Seria isso verdade? Sabemos que todo o tipo de acusação é levantada contra as Escrituras - já tentaram destruir a Bíblia de todas as formas imagináveis -, mas, como sempre, esses ataques fracassam. Espero que o breve artigo que segue te seja útil - tire as suas próprias conclusões.
Resumo do que seguirá, em ordem: 1 - A Bíblia não foi forjada; 2 - Novo Testamento Politicamente Incorreto; A - Um Cristo de poucos amigos; - Um Jesus amigo dos pobres e fracos?; - Um Jesus amigo dos ricos e fortes?; - Um Jesus amigo dos homens?; - Um Jesus amigo das mulheres?; - Um Jesus amigo dos religiosos?; - Um Jesus amigo dos não-religiosos?; - Um Jesus amigo dos sãos e bravos?; - Um Jesus amigo dos loucos?; - Um Jesus amigo dos bonzinhos?; - Um Jesus amigo dos pecadores?; - Um Jesus amigo dos nacionalistas?; - Um Jesus amigo dos estrangeiros (romanos)?; - Um Jesus amigo dos judeus?; - Um Jesus amigo dos gregos?; - Um Jesus pacificador?; - De quem Cristo era amigo, afinal?; B - O Livro dos Excluídos; C - Mais que um bom e sábio homem; Conclusão.
1 - A Bíblia não foi forjada, pois não houve tempo para tal: antes de entrar no "Politicamente Incorreto", afirmo aqui que a Bíblia, especialmente o Novo Testamento, não pode ter sido forjada, uma vez que temos fragmentos de manuscritos neotestamentários até do ano 50 d.C., menos de 20 anos depois da morte de Cristo, de modo que muitas das testemunhas oculares da vida, morte e ressurreição de Jesus ainda estavam vivas, impossibilitando o espalhar de mentiras como a forja das Escrituras. Além da antiguidade desses manuscritos, o número de manuscritos antigos da Bíblia derruba toda a argumentação de que o texto bíblico foi severamente deturpado ao longo da história, já que temos manuscritos numerosos que vão de 50 d.C., transpassam a Antiguidade, a Idade Média e a Era Moderna, alcançando os tempos contemporâneos, numa sucessão de cópias que atravessa toda a história humana dos últimos dois mil anos, podendo-se testar a originalidade da Palavra através dessa numerosa tradição (hoje temos tanto documentos do Século I, quanto do Século XV ou XXI, que podem ser comparados). Leia mais nos seguintes artigos desse blog: sobre a idade dos manuscritos bíblicos, sobre o número de manuscritos e sobre a preservação do texto.
2 - O politicamente incorreto Novo Testamento: o número de ofensas que o Novo Testamento desferia para a cultura de seu período o torna uma obra impossível de ter sido escrita como uma mentira interesseira - nenhuma classe social ou tipo humano está isento de críticas em suas linhas, de modo que ninguém, humanamente falando, acharia conveniente acreditar no Novo Testamento. É claro que o "politicamente aceitável" nos dias de Cristo era diferente do "politicamente correto" de nossos dias, não esqueça disso.
A - Um Cristo de poucos amigos: Jesus, entendido nos Evangelhos, foi um cara nada interesseiro, de modo que estava disposto tanto a ajudar quanto a criticar todo o tipo de gente, sem distinção de classe, função, cultura. Havia (e há) uma mensagem a ser pregada, a Verdade, e nenhum interesse humano poderia colocar essa vital missão em risco. Se os apóstolos tivessem inventado Jesus e desejassem aceitação, não o teriam feito sob uma configuração tão inapropriada para todas as esferas sociais, não o teriam feito ideologicamente inaceitável para todo mundo. Cristo não poupa ninguém! Mas sabe amar a todos igualmente.
- Um Jesus amigo dos pobres e fracos? Sim, o próprio Jesus era pobre, escolheu ser assim, precisava ser assim, mas isso não significa que ele pretendeu ser um revolucionário pró-plebe, não! Sua revolução nunca foi política, mas, sim, espiritual. Jesus andava mais com os pobres, é claro, mas isso porque ele estava sempre nas estradas, nas ruas, nas praças, no meio do povo, nunca nos palácios e casarões paparicando os poderosos, porém, se um rico aparecesse por ali querendo ajuda, ele seria tão amistoso com esse rico do que com qualquer pobre. A questão de Jesus era a pessoa, o indivíduo, e não o seu status. Se você fosse um pobre dos dias de Cristo, seguiria o Mestre? Vejamos: ele não iria te alimentar só porque você deseja encher o estômago sem trabalho (João 6:25-27); ele não iria fazer o mundo girar ao redor de você só porque você é "pobre e excluído" (Mateus 26:6-13); ele não iria te poupar dos teus deveres para com Deus só porque "lhe falta bens" (Lucas 21:1-4); ele não iria te incentivar a não pagar impostos, mesmo que eles fossem abusivos (Lucas 20:20-25); se você lhe dissesse que "ganha muito pouco" ele não iria inflamar teu coração com desgosto pelo teu empregador, mas iria te estimular a um esforço e uma fidelidade maiores para com ele, de modo a cair na sua graça e receber uma remuneração melhor e merecida (Mateus 25:1-30). Sim, isso tudo ele te diria, porém, ao mesmo tempo, te aceitaria de braços abertos, mesmo sujo, doente ou defeituoso (Mateus 11:28; Mateus 9:12; Lucas 14:12-14); ele te faria perceber que, melhor que o pão e a água nutritivos para carne, é o Pão Vivo, que é Ele e Sua Palavra e a Água Viva, que é o Espírito Santo no cristão (João 6:48; Mateus 4:4; João 4:14); ele se relevaria a ti, mesmo sendo tu, porventura, ignorante (Mateus 11:25); ele te traria paz e segurança para além do conforto material (Mateus 6:25-34).
- Um Jesus amigo dos ricos e fortes? Se Jesus tivesse sido inventado pelos apóstolos, ou o faria compatível com um revolucionário pró-plebe (o que nitidamente não fizeram), ou o fariam amigo dos nobres, para que os poderosos de Israel financiassem o movimento. Nem amigo dos ricos Jesus era! Ele não precisava paparicar os endinheirados! Não lhe era necessário evangelizar num belo corcel branco, ter um casarão confortável na beira do Tiberíades, ser financiado e escoltado em viagens evangelísticas em Jerusalém ou, quem sabe, num barco emprestado, ir até Roma garantir algumas regalias dos nobres hebreus dos quais, por fim, seria apenas um emissário, um capacho. Não, Jesus nunca paparicou ninguém, tanto que seus seguidores mais íntimos, os 12 discípulos, com exceção de Judas Iscariotes, eram apenas pobres camponeses semi-analfabetos da desprezada Galiléia. Que apelo teria, pra começar, a figura do filho de um carpinteiro, vindo do Fim do Mundo, também morador da ridicularizada Nazaré, nascido numa caverna entre os animais e deitado primeiramente no cocho do gado? Que teve o nascimento anunciado, primeiramente, a pobres pastores de ovelha (Lucas 2:7-12)? Que apelo tinha um andarilho sem propriedades (Mateus 8:20) que, inclusive, foi sustentado por mulheres (Lucas 8:1-3)? Que apelo tinha um andarilho acompanhado quase exclusivamente por gente pobre e da mesma terra pouco louvável que ele? Se você fosse um rico dos tempos de Jesus, se prestaria a segui-lo e, constantemente, sentir-se envergonhado, humilhado, rebaixado por estar no meio da ralé? Se você fosse um rico nos tempos de Jesus, certamente ele iria querer você, mas rejeitaria todos os seus bens (Marcos 10:21-22) - pode até ser que, segundo teu coração, ele permitiria a manutenção das tuas riquezas, mas você seria considerado tão importante quanto qualquer um, nada mais e nada menos; ele não iria valorizar as tuas ofertas no Templo com base na quantidade, mas na qualidade da tua adoração (Lucas 21:1-4); ele não iria nem querer saber quanta esmola tu daria aos pobres (Mateus 6:3-4); se você aumentasse as suas riquezas, ele não ficaria impressionado (Mateus 6:19-20), mas é provável que se alegraria contigo - e não por interesse (Mateus 7:11). Certo, Jesus não iria estar nem aí pras tuas riquezas, mas você pode ter certeza que teria um amigo verdadeiro, não regido por intenções gananciosas. Pode ter certeza que, se ele te elogiasse, não o seria para bajulação, e pode ter certeza que ele não se afastaria de você só porque você teria mais bens do que ele.
- Um Jesus amigo dos homens? Outro recurso que os apóstolos provavelmente teriam usado, caso o Evangelho fosse uma mentira, seria o apelo ao patriarcado: Jesus seria um machão machista, amigo dos machos-alfa, dos patriarcas e, por consequência, defendido pela classe religiosa, política e cultural de Israel, já que somente os homens tinham acesso à Torá e detinham cargos religiosos e políticos, de modo que, se divulgado por esse tipo de gente, o então "baluarte dos homens" influenciaria a sociedade facilmente em todas as suas esferas. Claro que Jesus era machão, vide o evento no Templo, quando expulsou à chibatadas um punhado de vendedores gananciosos (João 2:14-16), ou quando simplesmente se desvencilhou da multidão que queria atirar-lhe para baixo de um penhasco (Lucas 4:28-30), mas isso não significa que ele desprezava as mulheres! Só um Jesus não inventado daria tanta importância ao gênero feminino, na contramão de uma sociedade que considerava "o melhor da mulher pior que o pior do homem", que jamais dava crédito a palavra de uma mulher, considerando tal gênero "traiçoeiro", e na qual uma mulher jamais poderia dirigir-se a um homem que não fosse o seu marido. Jesus foi gente boa com as mulheres, criando estranheza da parte dos opositores: se você fosse uma mulher dos tempos de Cristo, ele iria contra o "politicamente correto" e conversaria muito tempo contigo olhando nos teus olhos (João 4:7-27); ele acreditaria nas tuas palavras (João 4:16-19); ele te protegeria da morte, mesmo que você tivesse feito a maior besteira (João 8:4-7), mas te pediria uma mudança de comportamento (João 8:8-11); ele te distinguiria no meio da multidão e se preocuparia com o teu problema mais íntimo (Marcos 5:24-34); ele te ensinaria como se você fosse um "rabino", mesmo que os hebreus considerassem isso repugnante (Lucas 10:39 - mesma expressão usada para "Paulo assentado aos pés do mestre Gamaliel", Atos 22:3); ele iria ter permitir no grupo de discípulos dele (Mateus 12:46-50) e, quem sabe, até pediria uma ajudinha pra ti (Lucas 8:1-3). Além disso, as primeiras testemunhas da Ressurreição de Cristo foram as mulheres (Mateus 28:1-7; João 20:11-18)! Uma verdade mais do que inconveniente para os hebreus. Mas isso não significa que você, como mulher, seria o centro do seu mundo, da mesma forma que nem os homens o eram, pois, ainda assim, ele guardaria a liderança da sua Igreja aos homens (Mateus 16:18), embora alguns cargos te estariam abertos, como ser diaconisa (Romanos 16:1-2) ou mestre em ensino (Atos 18:24-26).
- Um Jesus amigo das mulheres? Em Jesus todos se equivalem, com distinções de função e autoridade, mas nunca de valor (Gálatas 3:28) e, portanto, o Mestre não veio encher a bola da mulher - todos valem a mesma coisa. Como já dito, apesar de todos os privilégios garantidos por Cristo, antes inimagináveis para o gênero feminino, a liderança da sua Igreja seguiu fundamentalmente nas mãos dos homens, como ele mesmo estipulou. Além disso, os três discípulos mais íntimos de Cristo eram todos homens, a quem experiências singulares foram dadas (Mateus 17:1-2) - na verdade, o grupo de discípulos mais próximo, o dos 12, era totalmente masculino (Mateus 10:2-4).
- Um Jesus amigo dos religiosos? Como o cristianismo brotava do judaísmo, quem mais os apóstolos deveriam impressionar eram os líderes religiosos de Israel e, caso a fé cristã fosse mentirosa, certamente uma boa jogada seria colocar Jesus ao lado dos fariseus e mestres da lei. Mas não, não foi isso que aconteceu. Jesus foi inimigo ferrenho dos religiosos, daquele tipo de gente que tem a religião como um trampolim social ou que simplesmente cumpre um monte de regrinhas sem pensar, por obrigação. Se você fosse um religioso dos dias de Jesus, ele não se impressionaria com o seu louvor chamativo, feito para encantar e invejar as outras pessoas (Mateus 6:5); ele não iria se compadecer da quantidade de orações que você fizesse, já que estaria mais preocupado com a qualidade delas (Mateus 6:7); ele não se impressionaria com a sua conduta socialmente exemplar, se o coração estivesse frio (Lucas 18:10-14; João 9:16); você poderia até dar grandes quantias de dízimos, mas o que realmente o agradaria seria a sua intenção ao fazê-lo (Lucas 21:1-4); ele também não se impressionaria com o seu show espiritual (Mateus 7:21-23); e, se você fizesse o máximo possível, ainda assim ele não te consideraria melhor que os outros (Lucas 17:10). Bom, tudo isso poderia te acontecer, mas esse mesmo Jesus estaria sempre disposto a considerar o teu louvor, quando feito de coração e com sinceridade, sem te desprezar se tu não tivesse muito a oferecer. Ele não quer fama humana, ele simplesmente quer ser teu amigo (João 15:13). Leia Mateus 23.
- Um Jesus amigo dos não-religiosos? Certo, se Jesus não exaltava as pessoas porque eram muito religiosas, talvez tenha sido amigo dos não-praticantes, afinal, se Jesus foi inventado, algum público específico ele teria que atingir para ser aceito! Imagino que os judeus helenizados ou os imigrantes romanos em Israel gostariam de seguir um judeu não-judaizante, garantindo um reforço ideológico para não serem judeus religiosos. Mas nem esses Jesus apoiava! Cristo não era um rebelde anti-semita, em hipótese alguma! E você jamais conseguiria impressioná-lo com demonstrações de "personalidade", desprendimento e mente-aberta, na verdade ele gostaria de te ver seguindo, de coração, todos os seus mandamentos (João 14:21; João 15:14). Jesus iria reprovar severamente qualquer comportamento teu que fosse contrário à vontade de Deus (Mateus 12:30). O Mestre reprovava a falsa religiosidade, mas jamais pregava uma mensagem religiosamente anárquica, bagunçada, personalizável. A porta de saída sempre foi tão grande quanto a de entrada (João 6:60-67).
- Um Jesus amigo dos sãos e bravos? Para angariar seguidores, um Novo Testamento mentiroso poderia pregar que uma mente e um corpo excelentes aproximavam de Deus, que um físico sarado e um cérebro genial deixavam as pessoas mais perto do Divino, pelo menos assim angariaria para si os bravos e fisicamente excelentes legionários romanos, assim como os intelectualmente superiores filósofos gregos. Quem sabe, com o braço militar e o cérebro do Ocidente, o cristianismo tomaria conta do Império Romano. Mas, não! Jesus nunca pregou excelência física e intelectual como critério. Se você fosse um soldado romano, Cristo jamais se admiraria da sua bravura militar e de seu aspecto físico, na verdade ele gostaria mais de ver você colocando o rabinho entre as pernas e, deixando de lado todo o teu poder e aparência, curvando-se diante dele, coisa que, aos olhos dos outros, seria uma desonrosa covardia (Mateus 11:28); ele ficaria mais feliz te vendo receber cicatrizes e marcas do ódio humano anticristão e da fome do que definindo a sua musculatura numa academia (Mateus 5:1-12). Caso você fosse um grande filósofo dos tempos de Jesus, dificilmente conseguiria deixar o Mestre eufórico ao expôr as profundidades da tua intelectualidade (Mateus 11:25), na verdade, embora ele gostaria de te ver usando a inteligência para proclamar o seu nome, o Messias se agradaria mais de ver em você a simplicidade e inocência de uma criança (Mateus 10:14-15).
- Um Jesus amigo dos loucos? Nós sabemos que a Palestina sempre foi um barril de pólvora prestes e explodir em revoltas e conflitos, já que lá sempre houve gente disposta a entrar numa briga. Se o Evangelho fosse mentiroso e nitidamente avesso às aspirações dos sãos, talvez encontrasse suas multidões entre os loucos e masoquistas - público pra isso não faltaria, já que todas as maiores religiões sempre possuem um grupo de fanáticos que se flagelam. Mas até desses Jesus não se impressionaria! Claro que, pra seguir a Cristo de verdade, o cara precisa ser louco por ele e viver a loucura de enfrentar esse mundo hostil, mas tal loucura é diferente daquela mentalidade suicida e imprudente, coisa condenada por Cristo em Mateus 10:16 (Mateus 25:1-13). Ficar se matando sem motivo e rasgando o corpo loucamente, jamais faria Jesus te achar um cara legal, mas ele certamente gostaria de ver você rasgando o seu coração, se quebrando espiritualmente diante dele (João 3:30).
- Um Jesus amigo dos bonzinhos? Bom, se o Evangelho fosse uma mentira, mas não servisse pra atrair nem os religiosos, nem os não-religiosos, nem os sãos e bravos, tampouco os loucos, quem sabe tentasse persuadir o povo pelo universalmente aceito "fazer o bem"? Ora, um Jesus que veio ao mundo só pra dizer que as pessoas devem ser boas, coisas que elas já sabiam, pode parecer inútil, mas certamente agradaria bastante! Há um grande mercado pra esse tipo de coisa "politicamente correta", mas, FELIZMENTE, o Novo Testamento não apresenta o Messias como um pregador da fraternidade. É claro que fazer coisas boas é legal, é claro que isso faz parte da vontade de Deus, mas a pessoa pode se arrebentar, de tão boa, "dando a outra face" (Mateus 5:39), dando, além da "túnica", a "capa" (Mateus 5:40), "andando a segunda milha" (Mateus 5:41) e emprestando dinheiro pra todo mundo (Mateus 5:42), mas se ele não crer em Jesus, se entregando ao Mestre como Salvador e Senhor, sua vida de boas obras, a sua bonita história, não o levará a lugar nenhum (João 14:6), nem pra memória servirá direito, já que as "traças e a ferrugem" irão apagar todos os rastros (Mateus 6:20). Fazer coisas boas é correto, mas Jesus fez questão de lembrar que nós não merecemos nada além da morte e que, portanto, fazer coisas legais não nos dá mérito algum diante dele (Lucas 17:10). A coisa complica quando vemos Jesus dando atenção a ladrões e prostitutas (Marcos 2:16; Lucas 7:36-50).
- Um Jesus amigo dos pecadores? O Politicamente Correto de nossos dias nos estimula a achar a prostituição algo bonito e até a considerar o ladrão como uma mera vítima da sociedade. Nos tempos de Jesus, porém, o Politicamente Correto era tratar prostitutas, ladrões e cobradores de impostos (gente que trabalhava aos odiados romanos) como subumanos, criaturas desprezíveis e intocáveis (a menos que fosse pra passar a faca). Nesse caso, se o Evangelho fosse uma mentira, provavelmente teria dado mais apoio aos religiosos judeus e aos fazedores de boas obras e tratado com o maior desdém os pecadores de marca maior, assim atrairia mais a atenção dos fariseus hipócritas, dos mestres da lei e de todos os outros que desejam se ver um nível acima de todas pessoas quanto puderem, mas não foi isso que aconteceu. Jesus, definitivamente, andou com os pecadores e desprezados (Marcos 2:16) - aí pode-se sugerir que os Evangelhos foram inventados e direcionados aos muitos pecadores declarados de Israel, usando desse vasto público como trampolim para o sucesso, porém nem admiração pelos pecadores Jesus demonstrava. Cristo até podia aproximar-se dos pecadores, mas sempre o fazia em caráter misericordioso, exortando para uma mudança de comportamento (João 8:11) - na verdade, o pecador, diante de Cristo, se sentiria mais pecador ainda, já que Jesus afirmou que só de olhar uma pessoa com intenção impura ou ódio, já estamos em pecado (Mateus 5:22 e 28).
- Um Jesus amigo dos nacionalistas? Os judeus dos tempos de Cristo simplesmente odiavam os romanos e a sua ocupação. Um dos meios de se divulgar uma mentira aceitável entre os judeus seria, justamente, o nacionalismo. Os judeus esperavam por um messias que fosse libertar Israel politicamente, através de uma revolta e, portanto, inventar um Jesus revolucionário, um Cristo xenofóbico, seria a coisa mais lógica, mas como o Evangelho é verdadeiro, acontece justamente o contrário. Mateus, o Evangelista, antes de ser discípulo de Cristo era um odiado cobrador de impostos (Marcos 2:14), Jesus fez companhia a gente que trabalhava para Roma (Lucas 5:27-32), também curou o servo de um centurião romano (Mateus 8:5-13) e, na hora de incendiar o povo contra o pagamento de impostos ao Império Romano, preferiu pedir-lhes que pagassem, em dia, as suas dívidas com César (Lucas 20:25). A decepção do povo com esse comportamento chegou ao ponto de, pouco depois de um grupo ter recebido Cristo como rei em Jerusalém (Lucas 19:35-38), outro (ou o mesmo) ter clamado por sua crucificação (João 18:39-40).
- Um Jesus amigo dos estrangeiros (romanos)? Pode ser que os apóstolos tenham sido financiados pelo Império Romano pra inventar uma história que sustentaria a sua ocupação, falando de um Jesus amigo dos estrangeiros. Mas, ao que parece, Jesus não era nenhum admirador dos romanos! Que amigo de César esse Jesus, que, depois de ter iniciado um forte movimento em Israel, não negou ser ele o "rei dos judeus", numa afronta direta ao prestígio do Imperador (Marcos 15:2), e, diante da religião romana e da divindade de César, afirmou-se Deus, coisa que incomodou romanos e judeus (João 4:26; 6:41; 14:6). Que amigo! De qualquer forma, os apóstolos, se tivessem criado uma mentira para agradar os romanos, não os fariam responsáveis diretos pela morte de Cristo (Mateus 27:27-38), não fariam Jesus dizer que os grandes romanos "não sabiam o que estavam fazendo" (Lucas 23:34) e, tampouco, ousariam afirmar que um legionário romano esqueceu de sua lealdade à César e ao panteão romano, considerando Cristo o Filho de Deus (Mateus 27:54). Para dificultar um pouco mais, o próprio Jesus afirmou que o seu ministério se daria prioritariamente entre os judeus (Mateus 10:6), só depois, com os apóstolos, é que os gentios receberiam enfoque. Mais estranho ainda seria pensar que os apóstolos teriam inventado uma mentira que levou-os ao martírio, perseguidos por ninguém menos do que Roma - alguns morreram por ações judaicas e pagãs em geral.
De qualquer modo, os romanos, latinos, teriam (e tiveram) dificuldade de crer num semita peludo do "fim do Fim do Mundo", um camponês dos camponeses e, pior ainda, israelita (Roma nutria um desgosto incontrolável por Israel e seu povo rebelde, sempre armando uma revolta e rejeitando a cultura e a religião romanas). Se os discípulos tivessem inventado o Evangelho para persuadir os romanos, fariam como Hitler fez século passado: criariam um Messias perfeitamente compatível com os ideais do povo a ser alcançado. Jesus foi o contrário!
- Um Jesus amigo dos judeus? Certo, se para os romanos o Evangelho não foi atraente, caso tenha sido uma invenção dos apóstolos, pode ter tido direcionamento para os judeus, não como nação de Israel, mas como descendência de Abraão. Ora, como se Jesus ofendeu os judeus de várias maneiras? Desafiou a concepção errônea, porém universal, do sábado (João 9:16), prejudicou os negócios do Templo através de uma baderna (Lucas 19:45-48), até mesmo "ameaçou" destruí-lo (Marcos 13:2), demonstrou uma intimidade com Deus que, aos olhos dos judeus, chegava a soar profana (João 10:30), se considerou Deus (João 10:30-31; João 8:58), falou com samaritanos, odiados pelos judeus (João 4:9), andou com mulheres, pecadores, estrangeiros, camponeses e valorizou crianças, como já citado - tudo "politicamente incorreto". Cristo, analisado sob tais perspectivas, era exatamente o tipo de gente mais odiável para os judeus. Pior ainda é pensar que o Messias morreu de uma forma que o Antigo Testamento considerava digna de "gente maldita" (Deuteronômio 21:22-23), no meio de ladrões (Mateus 27:38) e, pra encerrar, ainda dando a entender, antes de morrer, que Deus o tinha abandonado (Marcos 15:34). Se não fosse verdade, seria inteligente descrever que a morte de Cristo provocou tremores e rasgou o véu do Santo dos Santos aos meio, como um nítido rompimento com a Antiga Aliança? É lógico que isso ofendia os judeus (Marcos 15:38).
- Um Jesus amigo dos gregos? A política quem dominava era Roma, mas a cultura do Mediterrâneo era predominantemente grega. Seria interessante para os apóstolos, caso o Evangelho fosse uma mentira, atraírem os gregos, mostrando uma simpatia de Cristo para com o pensamento de seus filósofos. Mas nem nos gregos Jesus procurou admiração. Além da já citada questão da intelectualidade, os gregos teriam dificuldades em crer num Cristo que morreu e ressuscitou. Para eles a existência de um homem perfeito, excelente, filho de Deus, era aceitável, até porque eles já estavam acostumados com isso, mas a pregação de Cristo, descreditando a necessidade de excelência física e intelectual, juntamente com a forma vergonhosa com que morreu, em oposição à regra grega de que "heróis vivem e morrem cinematograficamente", e a sua ressurreição dos mortos (os gregos eram abertos a muitas ideias, mas esse negócio de "ressurreição" lhes era insano demais, Atos 17:31-33), formavam um combo anti-helênico - não que o cristianismo pregue um afastamento da filosofia grega, pelo contrário, mas os gregos da época de Cristo tinham todos os motivos para não serem cristãos.
- Um Jesus pacificador? Já que Cristo não se encaixava bem em nenhum padrão de sociedade humano pré-estabelecido, talvez ele tenha sido inventado pelos apóstolos para disseminar o cristianismo no mundo todo, sem orientação para nenhum povo específico, mas para todos, através de um lindo e maravilhoso discurso de paz e amor. Sim, Jesus pregou "paz e amor", mas de um modo muito menos meloso, colorido e delirante do que os hippies fizeram na metade final do Século XX - lembre-se que foi Jesus o cara do chicote no Templo. O amor que Cristo pregou nada teve com cultivar flores e resgatar pinguins (claro que isso é louvável e digno de ser incentivado), muito menos esse "amor" direcionava-se para mil abraços e beijos apaixonados (principalmente nas formas peculiares de "amor" de nosso mundo atual), o amor que Cristo pregou era do tipo mais incomum possível, não uma ridícula paixão, mas daquele tipo que caminha até a morte pelo próximo, um amor sacrificial até o limite mais extremo (João 15:12), um amor sem malícia, sem segundas intenções, sem bajulação, um amor verdadeiro, daqueles que quase ninguém conhece, mais racional do que emocional (Lucas 6:27). Jesus também não foi do tipo que caminhava por aí de camisa branca e com uma bandeira de pomba, na verdade a "paz que Cristo dá" (João 14:27) é mais uma condição espiritual e emocional de tranquilidade e segurança do que uma cômoda aliança ou tratado de paz com o inimigo. Para Cristo não existe tratado de paz com inimigo algum: ele incentiva o seu seguidor a enfrentar o que for preciso por amor ao Seu nome, produzindo uma inimizade dele para com o mundo (João 15:19), contra si mesmo (Lucas 9:23) e contra Satanás (Mateus 13:39), de modo a enfrentar o que for preciso pelo nome de Cristo, o que inclui a própria família (Mateus 10:33-39). Em momento algum é dito que devemos matar em nome de Jesus (Mateus 5:39), antes temos que morrer por ele, o que é dito é que devemos amar as pessoas de modo a nos opormos aos seus pecados e às amarras desse mundo em prol a sua libertação.
- De quem Cristo era amigo, afinal? Jesus, na questão do pecado e das convenções humanas, foi inimigo de todos os povos e classes desse mundo, até porque ele não era desse mundo, sendo assim, de quem Cristo foi (e é) amigo? Ele ama todos os seres humanos, observando apenas o fato de serem seres humanos, e nada além disso, de modo que não existem fronteiras geográficas, culturais, históricas, étnicas, intelectuais e materiais para o seu amor, ele ama a todos e, justamente por isso, não favorece ninguém com base em questões observáveis, enquanto, ao mesmo tempo, favorece a todos com sua graça, com a salvação garantida a qualquer um que nEle acreditar e que considerá-Lo Senhor e Salvador (João 3:16). É claro que os apóstolos, se estivessem mentido em seu relato, não o teriam feito com um objetivo tão nobre - por qual motivo mentirosos desonestos escreveriam algo pelo qual morreram? Escreveriam para divulgar uma suposta salvação universal para todos aqueles que viessem a acreditar na figura central da sua mentira? Quem sabe fossem apenas piadistas fazendo uma pegadinha com o povo: "quando vocês morrerem, vão descobrir que enganamos vocês! Até vamos ser martirizados para sustentar essa piada!" Que lucro, além de fome, desprezo, vergonha, perseguição e morte eles obtiveram com essa mensagem? E, como analisamos nos pontos anteriores, não há nenhum outro possível motivo além desse (uma mensagem universal de salvação eterna) para a confecção do Evangelho, já que o mesmo é incompatível como chamariz para qualquer grupo específico de pessoas. Se os apóstolos inventaram Jesus, ao mesmo tempo eles foram muito burros, pois criaram alguém que soube criticar e declarar guerra contra todo o tipo de comportamento humano e contra todos os povos, enquanto absurdamente geniais, desenvolvendo a personalidade mais perfeita, complexa e admirável de toda a história humana - alguém tão maravilhoso e surpreendente quanto Cristo não poderia ser inventado por pessoas comuns e, se fosse milagrosamente inventado, essas mesmas pessoas não lucrariam nada com isso, pois tal perfeição viria carregada de algo grau de desprezo dos povos desse mundo, que logo matariam os autores.
B - O Livro dos Excluídos: o Novo Testamento é surpreendente não só por causa de Cristo, mas também por causa de seus autores. Pra começar, gente como Pedro, Tiago e João eram nada mais do que meros camponeses galileus de famílias humildes, que teriam dificuldade de aceitação nos círculos mais intelectuais, em segundo lugar, gente como Mateus, um odiado cobrador de impostos, e Lucas, um estrangeiro, custariam a cair na graça dos judeus. Nem preciso falar de Paulo, que por quase toda a vida ficou marcado como um cruel e famoso perseguidor de cristãos - esse teve dificuldade de ser aceito pelos cristãos e, inclusive, pelos judeus, que o tiveram como um traidor. Se a Igreja tivesse inventado toda essa história, teria imaginado autores menos problemáticos e, certamente, teria ocultado os deslizes vergonhosos desses "heróis", como Pedro, que nega Jesus três vezes, ou como quanto Pedro, João e Tiago dormem enquanto Jesus sofre terrivelmente no Getsêmani - tal dor de Cristo, que chega a expelir sangue dos olhos, também demonstra uma inconveniente fraqueza. A autoria e os relatos incômodos mostram que o Novo Testamento é veraz.
C - Mais que um bom e sábio homem: o Evangelho é autêntico, uma vez que os apóstolos não teriam inventado algo tão inaceitável para todos os homens de seu período, no qual nenhum grupo encontrava-se no centro, com todos em parte criticados e em parte elogiados. Nesse caso, sendo o Evangelho autêntico, alguns podem defender que ele apenas transmite a mensagem de Jesus como um "bom homem", mas, eu pergunto, um "bom homem" mentiria e manipularia pessoas tão descaradamente, afirmando ser "Deus"? Outros podem dizer que Jesus foi apenas "um sábio", mas, pergunto, um "sábio" seria louco o suficiente para afirmar-se "Deus"? As profundíssimas palavras de Cristo mostram-no como um gênio que dificilmente desceria a um poço tão fundo de insanidade - e o seu evidente amor, descarando a sua bondade, barra a ideia de que ele estava mentindo quanto a sua condição, até porque ele foi morto por causa de suas declarações. Jesus considerou-se divino e demonstrou extrema sabedoria e bondade, enquanto aceitou adoração humana, de modo que não era mentiroso e nem louco, culminando na verdade inquestionável de que era (e é) Deus, coisa que a Ressurreição deixou mais do que clara.
Conclusão: a Mensagem do Novo Testamento é tão incompatível com o ser humano em sua condição natural ou pré-cristã que apenas umas poucas décadas depois de Cristo já surgiram algumas heresias, querendo adaptar a politicamente incorreta Boa Nova ao pensamento grego, às religiões orientais e ao judaísmo. Compreensível, já que uma nova civilização nasceu com Cristo, com aspectos totalmente novos e desconhecidos a todos, de modo que o processo de aceitação da fé cristã exigia amplo abrir mão de conceitos milenares - uma dolorosa passagem para o "caminho estreito". Quem iria querer acreditar em algo que estimula o homem a lutar contra sua própria vontade? Quem inventaria algo assim?! É por isso que o homem tentou dar umas modificadas na Boa Nova, preservando parte da maravilhosamente revolucionária mensagem cristã em parceria com alguma coisa pré-cristã, pra tornar o negócio mais aceitável, atitudes que acabaram comprometendo a essência do Evangelho. Os Primeiros Séculos da Era Cristã seguiram com uma intensa luta contra as heresias (ninguém queria ser perseguido e morto por uma fé repleta de mentirosos) e com perseguições severas contra os cristãos, desenvolvidas pela espada, pelo pensamento e zombaria, mas, ainda assim, contra todas as expectativas, o número de cristãos aumentou assustadoramente. A religião dos fracos ganhou fiéis na legião romana e até na guarda pessoal do Imperador; a religião dos pobres atraiu gente das classes sociais mais elevadas; a religião dos ricos fez multidões de famintos pregarem pelo Mediterrâneo inteiro; a religião dos romanos ganhou os judeus e a religião dos judeus ganhou os romanos; a religião dos intelectuais ganhou os humildes enquanto a religião dos ignorantes atraiu inúmeros intelectuais; a religião das mulheres persuadiu os homens e a religião dos homens se encheu de mulheres, isso enquanto a religião dos loucos infestou-se de gente prudente e a religião dos prudentes virou uma loucura (e que loucura). A religião de ninguém atraiu todo mundo!
É claro que as estradas romanas, a diminuição da pirataria no Mar Mediterrâneo, a sede por uma religião nova e mais pessoal, o desânimo para com as religiões tradicionais, a língua grega por todo o lugar e a "paz romana" facilitaram a expansão do cristianismo, mas a aceitação de uma fé que não privilegia ninguém, mas faz todo mundo se sentir culpado de alguma coisa, precisa de um empurrão extra. O ser humano não gosta muito de se deparar com verdades inconvenientes e compromissos exaustivos, por isso é improvável que essa nova religião tenha conseguido varrer os milenares e suficientes paganismos anteriores, criados segundo os interesses de seus fiéis, já que o cristianismo, numa análise superficial, não parece beneficiar diretamente ninguém, pelo menos do ponto de vista carnal. O que fez a religião mais sincera e, por isso, censurável do mundo, ganhar espaço suficiente para se tornar, de longe, a maior de todas? A única coisa que pode explicar o explosivo crescimento de algo contrário a tudo o que o homem deseja e nascido num ambiente totalmente árido para o seu crescimento reside em estrondosos e inquestionáveis eventos históricos. Apenas a real existência de alguém nitidamente divino, em palavra, atitude e poder, apenas a real e extremamente bem divulgada ressurreição de Cristo, trariam tamanha energia para o cristianismo, creditado por milhões (hoje bilhões), mesmo sendo exatamente o que, carnal e claramente, ninguém quer. Apenas a nítida ação do próprio Deus através de Cristo e do Espírito Santo pode explicar a origem e a expansão do cristianismo!
Natanael Pedro Castoldi
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